Meus queridos,
Hoje a mãe foi confrontada com não uma, não duas, mas três histórias de amor. Chamá-lo-emos assim, para todas as faixas etárias e graus de
profundidade de afectos envolvido. A mãe não é sequer testemunha (se não
auditiva) de todos estes romances e, em cada um deles, é apenas conselheira de
um dos lados. Desconhece o outro lado da moeda.
Digamos que apurou o mesmo problema em todas as vozes femininas
envolvidas, de vinte e quatro anos a setenta. Algumas destas quatro mulheres
têm/tiveram vidas afectivas activas, pontuadas de vários companheiros e algumas
separações. Algumas têm pouca experiência com o bicho-Homem, outras estão
traumatizadas com histórias passadas. É importante referir que a de setenta
anos proclama uma vida sexual satisfatória com o seu improvável par, vinte anos
mais jovem. Eu oiço e pergunto-me como acabo por ser a confidente de todas
estar mulheres e como, a dado momento das suas vidas, acabam sempre por me
procurar para ouvir o meu conselho. Que sei eu de homens? Da vida? De sexo? De
confiar?
Todas estas mulheres têm um problema em confiar. Todas recearam/receiam, desde o primeiro momento, pelas
suas jovens relações, todas elas que brotaram de circunstâncias diferentes, com
obstáculos diferentes. Mais ou menos condenadas pela idade, a distância, o meio
fechado, as línguas alheias. E todas elas tentaram, arriscaram, puseram-se a
caminho, voltaram atrás, regressaram ao caminho. Pelo menos uma delas tem a
certeza de não ter qualquer tipo de interesse emocional no homem com quem está
envolvida – de que natureza for, e mesmo a intimidade é insípida -, mas também
não quer largar, deixar ir.
Do que precisam as mulheres? Todas concordam; que as façam sentir como
princesas. Alguns homens não têm esse talento. Alguns usam e abusam desse
talento. Alguns são peritos em fingir esse estado de meiguice. Mas a mulher
cai, porque nem a mulher mais rígida, nem a mais vivida, resiste a um “bom dia,
princesa”. E porque será tão importante para a mulher sentir-se uma princesa?
Falando por mim, não no “bom dia, princesa”, mas no mais belo ainda “boa
noite, princesa”, significa que esse homem é capaz de ver ainda algum valor em
mim. Para lá de tudo o que as mulheres sofrem pela condição da natureza, para
além das moças que as circunstâncias imprimem em nós – o stress, o trabalho, o envelhecimento, as quebras emocionais, o
cabelo espigado, as unhas lascadas, as pernas mal depiladas, as mechas
cinzentas, as nódoas negras nas canelas, a palidez de uma pele que não vê sol, os lábios a precisarem de ser hidratados, o
nariz a escamar de uma crise severa de alergia, a voz irritante e as cobranças
sem nexo – há um homem que nos compara à ideia de uma princesa. Alguém que,
basicamente, se dispõe a ignorar os defeitos e a abraçar apenas aquilo que em
nós em bom. Alguém que diz “não te preocupes que os defeitos são discretos”,
mesmo que sejam gritantes.
O medo. Estas mulheres embarcaram nas suas histórias já com medo. Este
maldito jogo da tecnologia de hoje em dia – é difícil roubar-se beijos pelo telemóvel
ou discernir brilhos de divertimento nos olhos de alguém através dos pixéis de
uma má ligação de skype. É difícil
dançar com alguém que “partilha” uma música connosco à distância de um
computador. Mas é fácil saber que a pessoa leu a nossa mensagem e não
respondeu. Que está a jogar Candy crush
mas não nos disse boa noite. Que pôs “gosto” na fotografia do cãozinho da vizinha
mas não no nosso artigo sobre energia nuclear. Então aprofundam-se as dúvidas. “Mas
o que é que ele quer de mim, afinal?”, “Mas porque é que me trata como uma
princesa se depois me ignora dois dias seguidos?”, “Mas porque é que me
perseguiu durante uma vida inteira para depois me deixar quando finalmente cedo
ao final de duas semanas?” “Nada fazia prever que…”
A vida não é bem o que imaginamos, e o amor muito menos. É preciso saber
lidar com a incompreensão, os invejosos e os ressabiados, os ex., os que nutrem
paixões secretas pelo objecto do nosso amor, os pais que desaprovam, a
distância que se interpõe, a idade que os divide em diferentes gerações, as
maratonas semanais sem qualquer sms,
qualquer telefonema (para o aparelho de casa, móvel, de trabalho, skype), qualquer e-mail (para o Gmail, o Hotmail, o maria@departamentoderecursoshumanos...,
qualquer mensagem de whatsapp, skype, qualquer tweet, qualquer comentário ou gosto no facebook, qualquer palavrinha no mypace, no voicemail, qualquer
chamadinha de voz ou vídeo no Facetime.
Como diz a Drew Barrymore no “He is Just not That into you”, hoje em dia é
exaustivo sermos rejeitadas em mil e uma plataformas diferentes. E quando um
homem nos diz que teve tempo para x, x, x e x, mas que não viu a nossa sms a entupir-lhe a caixa de correio a tarde
inteira, a mulher desconfia. Pode até ser verdade, mas a mulher desconfia. E
cedo ou tarde vêm as amigas dizer que ele não parece muito interessado (se
tivesse faria y), e a mulher, se está interessada, pergunta-se “Realmente, que
quereria ele com alguém como eu?”. Passa a ver-se como objecto defeituoso, a
indagar se terá feito algo errado. Terá
sido demasiado tímida? Demasiado ousada? Julgá-la-á frígida? Promíscua? E
vai na volta está a fingir orgasmos para tentar mantê-lo feliz, preso a algo
que não tem pernas para andar.
Ou ele profere, como aconteceu num destes casos, a mítica frase “sim,
estive contigo e com a outra. Que tem? F*** as duas”, e assim arruma a grande
mulher no saco da ordinária que toma banho uma vez por semana.
Ou ele pede-lhe que confie, como acontece noutro dos casos, e procura
estar com ela o máximo de tempo possível, e ela acha-o tão bom que duvida que
exista, e parece mais credível pensar que é um aldrabão com alguma fisgada.
Ou ele abre a sua caixinha de recordações e partilha tudo com ela, diz
que gosta de conversa de almofada, e sofre de uma impotência que já levou ao
naufrágio doutras tantas relações. Deixa de lhe falar por dois segundos e ela
não sabe se ele é homem, se está farto, se a quer para curar a sua disfunção,
se gosta de facto dela, se quer que fique, se quer que vá, se está cansado, se
ela o pressiona, se o deixa demasiado solto e parece desinteressada.
A mãe, como vos tem tido, está sozinha. Está feliz. Mas vê, ouve,
aprende. E a mãe acha que milagres acontecem, e que a pessoa certa para ti verá
além de todo o resto, como se fosses detentor de um brilho especial que só
reage ao seu olhar. E assim, mesmo que todo o mundo te diga que és baço, deves confiar. Deves confiar na luz que o
outro diz ver em ti, apenas se vires luz nele também.
O que é certo será, e o que não é…
Nunca foi para ser.