domingo, 5 de julho de 2015

Carta aos meus filhos #83

Acham que a mãe está a conseguir fingir bem que é feliz?
Deixem-me descrever-vos o que pode acontecer:
Vocês são jovens, têm os vossos vícios e manias. Dificilmente se apegam a alguém.
A mãe conseguiu ultrapassar esse obstáculo duas vezes. Da primeira vez, quase morri quando acabou. Nunca tinha sido tão feliz e nem podia acreditar que fosse possível ser-se.
Desta vez não houve ilusões: a mamã cometeu a estupidez de se apaixonar de novo. Sabe que ainda consegue desligar esses fusíveis no seu peito, mas não é isso que importa. Algumas pessoas gostam de ser infelizes. Gostam de viver a recordar o passado. A mamã já viveu de recordar (e escrever e reescrever o passado). O que importa é que, a cada vez que a mamã se engana, a cada vez que a mamã sofre, a cada vez que não me amam de volta, fico mais longe de vocês. Tenho menos coragem para ficar e ver no que isto dá.
A mamã pode ser muito egoísta quando diz que só quer ser feliz… Na realidade quero uma casa sem discussões, com um amor silencioso que viva da paz intrínseca a duas pessoas que não vão a lado nenhum.
A mãe sente uma agonia constante. Apetece-me chorar (o que é trágico). Apetece-me dormir (trágico ao quadrado). Apetece-me desaparecer (trágico ao cubo).
Acho que entendem a ideia.

O cão preto meteu-se a uivar e a mamã sabe que, desta vez, não vai a lugar nenhum. Sou dele.


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